sábado, fevereiro 12, 2011

Fio de Prumo


" Há uns dois ou três anos atrás, um grupo de jovens foi apelidado de «geração rasca». Tudo porque ousaram mostrar a nudez dos seus trazeiros, nos quais haviam inscrito as suas reivindicações. A atitude foi considerada ofensiva da moral vigente. Lembro-me de, à época, inquirida por um jornalista sobre o que eu pensava do assunto, ter respondido qualquer coisa do tipo: «Quanto ao meio escolhido - as nádegas - esteticamente não beneficiaram a mensagem. Quanto ao conteúdo, a natural rebeldia da juventude justificaria a provocação.» Mas acrecentei que « quem naquela altura da vida, não fizer alguns dislates, acaba, quase sempre, por fazê-los mais tarde. Com o inconveniente de, então, já não haver a desculpa da idade...»
A insolência do vocabulário ultimamente usado por alguns ilustres deputados e políticos desta praça, vem, não só pôr em causa as tentativas escolares e familiares de educar e ensinar boas maneiras, como justifica, plenamente, todos os abusos de linguagem, que um qualquer estado de alma dos nossos jovens possa ditar.
Há dias, um neto meu que, comigo, assistia ao canal Parlamento, olhava, atónito, para o espectáculo que ali se desenrolava. Perturbado, interrogava-me porque é que «aqueles senhores» gritavam em vez de falarem e se insultavam uns aos outros, sem sequer se ouvirem. Claro que aproveitou, logo, para me questionar sobre o «valor» dos meus ensinamentos, que contrariavam tudo a que acabava de assistir. E, mais grave, porque mais dificil, quis entender o papel da Assembleia da República. Na sua ingenuidade, insistia em saber porque é que o «dono deles»- que me perdoe o Dr. Mota Amaral, mas o meu neto tem apenas nove anos - não lhes ralhava e os mandava calar, como a sua professora fazia lá na escola. Fiquei siderada. Paralisada, como agora costuma dizer-se. E segui a técnica hoje tão em voga, quando se querem evitar crises. Ou seja, protelei. Mas terei, no próximo encontro, de apresentar uma explicação plausível. Tarefa que não vai ser fácil para alguém que, como eu, sempre disse a verdade a este neto, cuja aversão à política é, se possível, ainda mais visceral do que a minha. A agravar a dificuldade, já anteriormente havíamos tido longas conversas críticas sobre os excessos linguísticos e não só, que se verificam no futebol. Os quais, aliás, sempre havíamos considerado como modelos a rejeitar.
Se, a este exemplo de trazer por casa, se juntarem as surpreendentes declarações do presidente da Comissão Europeia, Romano Prodi, que classificou de «estúpido» o Pacto de Estabilidade, deixando perplexo o senhor Solbes, teremos a exacta medida do nível reinante em Portugal e nesta hilariante Europa, à qual tanto nos orgulhamos de pertencer.
Vá lá adivinhar-se a razão por que todos estes incidentes me trouxeram à memória a tal geração rasca... Mas, acredito que, assistindo a tudo isto, ela tenha, hoje, um sorriso verdadeiramente angelical.
Enfim, parafraseando um amigo meu, «escuso de ficar descansada»..."

Quase nove anos passados, esta crónica tem toda a actualidade. A insolência verbal, quer no Parlamento, quer no futebol, está na mesma. Ou pior.

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